Aos 42 anos e com uma bem-sucedida carreira como ator, Felipe Folgosi teria tudo para se acomodar. Mas há alguns anos, decidiu fazer algo novo: escrever histórias em quadrinhos. No ano passado, lançou a HQ sci-fi Aurora, que produziu de forma independente e publicou através de financiamento coletivo.
No meio do ano, provavelmente entre junho e julho, o artista multimídia (ele também está escrevendo um roteiro de cinema!) deverá lançar sua segunda HQ, também de forma independente e com a ajuda de financiamento coletivo, e desta vez de terror.
Comunhão é uma história que mistura ação, suspense e terror psicológico, sobre um grupo de praticantes de corrida de aventura que se embrenham na Mata Atlântica e têm que lidar com um grupo liderado por um reverendo misterioso.
Em entrevista ao FICÇÃO TERROR, Felipe Folgosi fala sobre sua nova HQ e sobre sua carreira. Confira abaixo:
FT: Você já
publicou no ano passado uma HQ de sci-fi chamada Aurora.
Comunhão é uma história de suspense, aventura e
terror. Pode falar um pouco sobre como surgiu a ideia da história
e quanto tempo levou para elaborar o roteiro?
FF: Em 2006, eu já
tinha escrito um primeiro longa em inglês e mandei para um
amigo americano que trabalha em um grande estúdio para ler.
Apesar de ter gostado ele me sugeriu que uma boa forma de começar
no mercado americano era com terror, já que é um
mercado com muita demanda e relativamente barato de se fazer. Achei
legal o desafio de escrever algo que não tivesse surgido
espontaneamente, que fosse uma sugestão. Foi um exercício
interessante para mim como roteirista pegar um tema e deixá-lo com a
minha cara. Essa foi a condição que me impus, não
podia ser simplesmente um "gun for hire" (até porque
ninguém tinha me contratado), mas tinha que ser uma história
que fizesse sentido para mim, com a qual eu tivesse uma conexão
pessoal, afinal é para isso que escrevo. Então comecei
a buscar coisas e ideias que me interessavam. A primeira foi o
ambiente, eu gosto de fazer trilhas e acampar. A ideia de sobreviver
na natureza, que afinal de contas foi o primeiro desafio do homem.
Daí veio a ideia de um time de corridas de aventura que vem
participar em uma prova no Brasil. Outro tema que me interessa é
até onde vai a civilização. Quando deixamos a
"normalidade" e os códigos sociais e passamos a ser
mais animais, algo como Coração das Trevas? Por último, é até que ponto que o ser humano
aguenta passar por sofrimento e tragédia antes de perder a
esperança e "quebrar" internamente? De tudo isso, saiu o Comunhão.
FT: Como está sendo
o processo de produção de Comunhão em parceria
com o desenhista JB Bastos? Como funciona o trabalho?
FF: Eu queria um artista
que tivesse um estilo que se encaixasse com a história.
Procurei entre vários do portfólio do Instituto dos
Quadrinhos e escolhi o Bastos porque além de excelente
artista, ele já desenhava quadrinhos de terror para a
Legendary Comics. Quis que o álbum fosse em preto e branco,
primeiro para homenagear os quadrinhos de terror dos anos 70, mas
também para que ficasse um projeto bem diferente do Aurora. No
Aurora, tinha feito o layout junto com o Klebs Júnior, mas no
Comunhão fiz sozinho as 134 páginas, o que foi muito
bacana. Tivemos um pouco de atraso na produção por
razões familiares do Bastos, mas mantive contato com os
colaboradores do Catarse que compreenderam a questão. Gosto de
trabalhar junto com o desenhista, até porque tenho adaptado
roteiros que já escrevi há muitos anos e tenho as
imagens muito claras na minha mente. Sei exatamente o que quero, mas
sempre é muito bom ver aquilo materializado pelas mãos
de um artista talentoso. Geralmente, o Bastos trabalha em cima do
layout, junto com o roteiro, me manda para a aprovação e
faz algumas alterações caso necessário. Estou
bem satisfeito com o resultado.
FT: Por que resolveu
enveredar pelo terror psicológico? Você é fã
do gênero?
FF: Como disse, foi uma
sugestão. Eu assisti muito terror da infância até
a adolescência. Cresci nos anos 80, vendo Sexta-Feira 13 e A Hora do Pesadelo, mas depois que perdi o "medo", deixei um
pouco o gore de lado e continuei vendo mais suspenses. Mas foi muito
divertido escrever um roteiro onde o gênero permite
decapitações e desmembramentos [risos]. Gosto do terror
quando não é banal, só splatter, mas
que usa essas situações extremas para explorar o estado
emocional dos personagens.
FT: Mais uma vez você
decidiu fazer a HQ de forma independente, recorrendo diretamente aos
fãs para viabilizar o projeto. Você chegou a apresentar
os projetos para editoras ou publicar de forma independente foi sua
primeira opção?
FF: Tive alguns convites de
editoras depois do Aurora, mas ainda preferi fazer de forma
independente para ter mais controle na produção, poder
escolher o artista, a capa, o papel, enfim. Dá muito mais
trabalho, claro que o ideal é inalcançável, mas
vai sair o mais próximo possível do que imaginei. Mas
em breve devo fazer uma experiência em publicar
tradicionalmente através de uma editora onde vou participar só
como roteirista.
FT: Como foi essa transição
de uma carreira estabelecida de ator para uma nova carreira como
roteirista de HQ?
FF: Poxa, é uma
daquelas coisas que a gente não espera, que a vida te
surpreende, mas, vendo em retrospecto, faz todo sentido. Minha vida
sempre foi em torno de quadrinhos e cinema. Fui fazer curso de teatro
e faculdade de cinema por causa disso. Quando era moleque desenhava o
tempo todo, fazia fanzine para os amigos do colégio, muitos
que lembraram da época e ficaram felizes quando lancei o
Aurora. Sempre procurei fazer aquilo que gosto. Claro que a gente tem
que pagar contas, mas fico muito feliz em poder trabalhar com o que eu
me divertia como criança e principalmente agora com os
quadrinhos, dividir as histórias e viagens com as pessoas me
da muito prazer.
FT: Sua bem-sucedida
carreira como ator tem te ajudado de alguma forma a divulgar suas
HQs?
FF: Com certeza. Tenho
consciência que ter acesso a mídia tem me ajudado a
divulgar, mas por outro lado sei que no início havia uma
desconfiança dos leitores sobre como seria o material e sei
que, se não fosse bom, se não tivesse pelo menos
qualidade gráfica (afinal gosto é subjetivo"), não
iria adiantar em nada ser ator, pelo contrário.
FT: E seus colegas atores
já leram seus trabalhos? O que eles acharam?
FF: Sim, alguns já
gostavam de quadrinhos e outros nunca tinham lido, mas todos gostaram
muito.
FT: Tem alguma referência
nos quadrinhos de horror?
FF: Sandman, Asilo Arkham e O Filho do Demônio.
FT: Você estudou
cinema e produção de roteiro na Universidade da
Califórnia. Tem alguma ideia de levar uma história sua
para as telas de cinema ou da TV?
FF: Sim, tenho um longa que
estou trabalhando para que seja produzido em breve.
FT: Além de
Comunhão, você está envolvido em algum projeto de
escrita neste momento? Alguma coisa na área de horror?
FF: Tenho um projeto com o
Joel Lobo, editor da "Selva - Gazeta Gráfica", que
deve sair na próxima edição, e, por coincidência, é um misto de humor, horror e melancolia.
FT: Para finalizar,
recentemente você estrelou um filme de thriller/terror
psicológico dirigido pelo pessoal do Cinelab, A Percepção
do Medo. Já tinha feito alguma coisa nesse sentido? Pretende
fazer de novo?
FF: Nunca tinha feito em
cinema, já tinha feito na TV tanto em Olho no Olho como em Os Mutantes alguma coisa que brincava com o
gênero, apesar de muito marmanjo que encontro hoje em dia dizer
que tinha medo na época [risos]. Foi muito divertido participar do
longa, principalmente por ter feito o vilão ou o "bully",
um tipo de papel que não me oferecem com frequência.
Gostaria de fazer outros projetos sim, logo que saiu The
Walking Dead só pensava em fazer um filme de zumbi, mas
até por escrever, como disse, gore por gore não me
atrai, o roteiro tem que ser bom.
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