Vou deixar uma coisa bem claro logo de cara. Condado Macabro (2015) é um filme nacional independente. Feito por brasileiros, com produção brasileira. Digo isso porque já li, muitas vezes, em redes sociais pessoas dizendo que "não gostam do cinema brasileiro", "não vão assistir um filme de terror brasileiro" e "se é brasileiro, é ruim".
Então faço questão de deixar isso claro. Quem tem preconceito contra o cinema brasileiro, sem ao menos fazer questão de assistir aos nossos filmes, pode parar de ler a resenha por aqui.
Para os demais amantes do cinema e do terror, o que eu tenho a dizer é que Condado Macabro, de Marcos De Brito e André de Campos Mello, é um filme nacional independente, sim. Mas não fica em nada a dever a filmes de terror americanos, inclusive aqueles bancados por grandes estúdios.
A trama é simples e a fórmula já foi usada em centenas de filmes slasher. Um grupo de jovens só querendo festa e sexo resolvem passar um feriado em uma casa no meio do mato. Então, uma dupla de psicopatas resolve matar todo mundo. Apesar da premissa ser bem conhecida e do final ser esperado, surpresas vão acontecer no meio do filme.
Porque o roteirista De Brito preparou algumas coisas legais no meio do filme. Antes dos psicopatas propriamente ditos aparecerem para fazer sua carnificina, dois palhaços sem grana resolvem invadir a casa e roubar os jovens.
Então, duas duplas de invasores se encontram durante a invasão da casa, provocando inicialmente uma confusão no espectador. E esse é um lado positivo, que traz uma pitada diferente ao slasher puro e simples.
O filme também é contado em duas narrativas cronologicamente separadas. Uma delas, no passado, conta a história das mortes propriamente dita. Outra, no presente, mostra o palhaço Cangaço (vivido por Francisco Gaspar) na delegacia, tendo que prestar depoimento, sobre os assassinatos cuja suspeita recai sobre ele. As duas narrativas se entrelaçam até que elas se encontram já no final do filme.
Algumas reviravoltas no final do filme também melhoram substancialmente o enredo da história.
Outra coisa muito legal no filme são as cenas cômicas. E são várias. Beto (vivido por Rafael Raposo), um jovem que só pensa e fala merda, protagoniza a maior parte delas. É muito engraçado.
Mas não espere ver um terrir. Sim, há a comédia (que inclusive está presente na maioria dos filmes de terror adolescentes americanos). Mas ela está mais presente na primeira metade do filme, quando o clima de terror ainda está sendo criado.
Na segunda metade do filme, quando a carnificina finalmente começa, há pouco espaço para a comédia. O clima de suspense e as mortes são levadas a sério. Não há tentativa de tornar ridículas
as mortes e as cenas de perseguição (com exceção talvez das vomitadas disparadas por Beto). E é aí que o filme se separa do terrir ou do terror cômico.
Os efeitos especiais são muito bem feitos. Tá, talvez tenha um exagero na quantidade de sangue que respinga nas pessoas. Mas mesmo o sangue exagerado é bem feito. Não há nada trash.
A transição das cenas e das sequências também são muito sutis. A história flui num ritmo muito bom. E acredito que as alternâncias entre as cenas da casa e da delegacia contribuem para isso.
O filme lembra muito as produções de Rob Zombie. Eu já tinha percebido isso quando vi o trailer, mas isso ficou bem claro ao ver o filme. Isso pode ser visto não só na estética, como também nos personagens. O uso de personagens surreais como palhaços e uma família degenerada são os mesmos ingredientes utilizados em A Casa dos 1000 Corpos (House of 1,000 Corpses, 2003) e Rejeitados pelo Diabo (Devil's Rejects, 2005). Este último é inclusive citado nominalmente no início de Condado Macabro.
De Brito e Mello também prestam um claro tributo a O Massacre da Serra Elétrica (1974). O psicopata brutamontes Jonas do filme brasileiro se parece muito com Leatherface, tanto por sua máscara de couro de porco quanto por sua serra elétrica.
A fotografia e a trilha sonora também são dignas de nota. A música brega traz um ingrediente nacional muito interessante (e um tanto peculiar para um filme de terror).
As atuações também são muito profissionais. Além de Beto, gostei muito dos personagens de Cangaço, o palhaço malandro, e Bola 8 (Fernando de Paula). Leonardo Miggiorin, que vive Theo, um jovem tímido, empresta o rosto conhecido para o filme, o que garante o toque ainda mais profissional ao filme.
O mesmo vale para os veteranos Marcela Moura, que vive a irmã psicopata de Jonas, e Paulo Vespúcio, que faz o papel do investigador. As três meninas também se saíram muito bem.
O filme não é perfeito, no entanto. Há alguns (poucos) buracos na trama.
Por exemplo, quando o investigador descobre que há sobreviventes entre os jovens, ele libera Cangaço da delegacia. Não há nenhuma razão para que ele faça isso. É claro que a liberação de Cangaço tem um papel preponderante para o final do filme. Mas os diretores poderiam ter arrumado um motivo claro para a liberação.
Outra coisa: entre o momento em que o investigador chega ao local do crime e prende o palhaço até o momento em que ele retorna à casa, para buscar os sobreviventes do massacre, se passam várias horas. Isso é fácil de perceber, porque há uma perícia no local (inclusive com o isolamento da área e a coleta de provas) e o palhaço passa várias horas sob interrogatório.
No entanto, sob a ótica dos jovens sobreviventes, parece que se passaram apenas alguns minutos. Isso porque, depois que Theo e Lena, conseguem fugir da casa (e isso acontece antes de Cangaço ser preso), tudo o que eles fazem é correr para a floresta, se defrontar com Jonas e depois com a irmã de Jonas.
Talvez isso pudesse ser resolvido se Lena ficasse horas escondida no chiqueiro dos irmãos psicopatas antes de se defrontar com a psicopata.
De um modo geral, o filme (que está disponível gratuitamente para assinantes do Telecine, no Telecine Play) é altamente recomendável. Uma produção de altíssima qualidade, principalmente em se tratando de um filme independente.
AVALIAÇÃO GERAL: Bom
NÍVEL DE TERROR: Fraco
O QUE ESPERAR: Comédia, violência e suspense
DADOS DO FILME:
Título original: Condado Macabro
Subgênero: Slasher/Terror cômico
Direção: Marcos De Brito e André de Campos Mello
Ano: 2015
País: Brasil
Duração: 143 minutos
Então faço questão de deixar isso claro. Quem tem preconceito contra o cinema brasileiro, sem ao menos fazer questão de assistir aos nossos filmes, pode parar de ler a resenha por aqui.
Para os demais amantes do cinema e do terror, o que eu tenho a dizer é que Condado Macabro, de Marcos De Brito e André de Campos Mello, é um filme nacional independente, sim. Mas não fica em nada a dever a filmes de terror americanos, inclusive aqueles bancados por grandes estúdios.
A trama é simples e a fórmula já foi usada em centenas de filmes slasher. Um grupo de jovens só querendo festa e sexo resolvem passar um feriado em uma casa no meio do mato. Então, uma dupla de psicopatas resolve matar todo mundo. Apesar da premissa ser bem conhecida e do final ser esperado, surpresas vão acontecer no meio do filme.
Porque o roteirista De Brito preparou algumas coisas legais no meio do filme. Antes dos psicopatas propriamente ditos aparecerem para fazer sua carnificina, dois palhaços sem grana resolvem invadir a casa e roubar os jovens.
Então, duas duplas de invasores se encontram durante a invasão da casa, provocando inicialmente uma confusão no espectador. E esse é um lado positivo, que traz uma pitada diferente ao slasher puro e simples.
O filme também é contado em duas narrativas cronologicamente separadas. Uma delas, no passado, conta a história das mortes propriamente dita. Outra, no presente, mostra o palhaço Cangaço (vivido por Francisco Gaspar) na delegacia, tendo que prestar depoimento, sobre os assassinatos cuja suspeita recai sobre ele. As duas narrativas se entrelaçam até que elas se encontram já no final do filme.
Algumas reviravoltas no final do filme também melhoram substancialmente o enredo da história.
Outra coisa muito legal no filme são as cenas cômicas. E são várias. Beto (vivido por Rafael Raposo), um jovem que só pensa e fala merda, protagoniza a maior parte delas. É muito engraçado.
Mas não espere ver um terrir. Sim, há a comédia (que inclusive está presente na maioria dos filmes de terror adolescentes americanos). Mas ela está mais presente na primeira metade do filme, quando o clima de terror ainda está sendo criado.
Na segunda metade do filme, quando a carnificina finalmente começa, há pouco espaço para a comédia. O clima de suspense e as mortes são levadas a sério. Não há tentativa de tornar ridículas
as mortes e as cenas de perseguição (com exceção talvez das vomitadas disparadas por Beto). E é aí que o filme se separa do terrir ou do terror cômico.
Os efeitos especiais são muito bem feitos. Tá, talvez tenha um exagero na quantidade de sangue que respinga nas pessoas. Mas mesmo o sangue exagerado é bem feito. Não há nada trash.
A transição das cenas e das sequências também são muito sutis. A história flui num ritmo muito bom. E acredito que as alternâncias entre as cenas da casa e da delegacia contribuem para isso.
O filme lembra muito as produções de Rob Zombie. Eu já tinha percebido isso quando vi o trailer, mas isso ficou bem claro ao ver o filme. Isso pode ser visto não só na estética, como também nos personagens. O uso de personagens surreais como palhaços e uma família degenerada são os mesmos ingredientes utilizados em A Casa dos 1000 Corpos (House of 1,000 Corpses, 2003) e Rejeitados pelo Diabo (Devil's Rejects, 2005). Este último é inclusive citado nominalmente no início de Condado Macabro.
De Brito e Mello também prestam um claro tributo a O Massacre da Serra Elétrica (1974). O psicopata brutamontes Jonas do filme brasileiro se parece muito com Leatherface, tanto por sua máscara de couro de porco quanto por sua serra elétrica.
A fotografia e a trilha sonora também são dignas de nota. A música brega traz um ingrediente nacional muito interessante (e um tanto peculiar para um filme de terror).
As atuações também são muito profissionais. Além de Beto, gostei muito dos personagens de Cangaço, o palhaço malandro, e Bola 8 (Fernando de Paula). Leonardo Miggiorin, que vive Theo, um jovem tímido, empresta o rosto conhecido para o filme, o que garante o toque ainda mais profissional ao filme.
O mesmo vale para os veteranos Marcela Moura, que vive a irmã psicopata de Jonas, e Paulo Vespúcio, que faz o papel do investigador. As três meninas também se saíram muito bem.
O filme não é perfeito, no entanto. Há alguns (poucos) buracos na trama.
Por exemplo, quando o investigador descobre que há sobreviventes entre os jovens, ele libera Cangaço da delegacia. Não há nenhuma razão para que ele faça isso. É claro que a liberação de Cangaço tem um papel preponderante para o final do filme. Mas os diretores poderiam ter arrumado um motivo claro para a liberação.
Outra coisa: entre o momento em que o investigador chega ao local do crime e prende o palhaço até o momento em que ele retorna à casa, para buscar os sobreviventes do massacre, se passam várias horas. Isso é fácil de perceber, porque há uma perícia no local (inclusive com o isolamento da área e a coleta de provas) e o palhaço passa várias horas sob interrogatório.
No entanto, sob a ótica dos jovens sobreviventes, parece que se passaram apenas alguns minutos. Isso porque, depois que Theo e Lena, conseguem fugir da casa (e isso acontece antes de Cangaço ser preso), tudo o que eles fazem é correr para a floresta, se defrontar com Jonas e depois com a irmã de Jonas.
Talvez isso pudesse ser resolvido se Lena ficasse horas escondida no chiqueiro dos irmãos psicopatas antes de se defrontar com a psicopata.
De um modo geral, o filme (que está disponível gratuitamente para assinantes do Telecine, no Telecine Play) é altamente recomendável. Uma produção de altíssima qualidade, principalmente em se tratando de um filme independente.
AVALIAÇÃO GERAL: Bom
NÍVEL DE TERROR: Fraco
O QUE ESPERAR: Comédia, violência e suspense
DADOS DO FILME:
Título original: Condado Macabro
Subgênero: Slasher/Terror cômico
Direção: Marcos De Brito e André de Campos Mello
Ano: 2015
País: Brasil
Duração: 143 minutos