É admirável a criatividade de Melvin Menoviks, pseudônimo do estudante de direito Gustavo Lopes Perosini e autor de A Caixa de Natasha e Outras Histórias de Horror (Ed. Novo Século, 2015). Em 18 contos, o escritor lança mão de um arsenal de histórias originais sem precisar recorrer aos clichês fáceis do gênero do terror.
Muitas das histórias do livro são realmente notáveis (apesar de algumas serem dispensáveis). Como não recorre aos clichês, o autor consegue criar enredos que, em geral, surpreendem o leitor no final. Entre meus contos favoritos estão Malpurga, Natan, A Orquestra Diabólica e A Experiência de William. As quatro me conquistaram pela narrativa relativamente mais simples e por serem as histórias mais sombrias do livros.
Malpurga conta a história de um velho que resolve contar uma história assustadora de sua infância: seu encontro com uma entidade demoníaca chamada Malpurga, que vive em um buraco no meio da floresta e arrasta as pessoas para o purgatório, uma imensidão cinza monótona e eterna. A ideia, em si, já é assustadora. A descrição que Menoviks faz da criatura torna a história ainda melhor. Agora, não sei de onde ele tirou esse nome. Cola na sua cabeça, não sei por quê. Talvez porque pareça com lactopurga.
Natan é a triste história de um pai que descobre que se filho é uma encarnação do diabo. Continho curto, mas eficaz. Já a Orquestra Diabólica é um conto muito interessante sobre uma apresentação sinfônica de Satanás. Quando o público descobre que o regente é o diabo, já é tarde. Não vou contar como termina para não estragar a história. Mas o final é bem interessante.
Por fim, A Experiência de William fala sobre um menininho perturbado que sonha unir os cérebros de dois gatinhos para criar um super animal e, assim, conquistar uma garota de sua escola que nem sabe que ele existe. Mas, quando ele ouve em um sermão eclesiástico que os animais não têm alma, ele acredita que esse é o motivo pelo qual esse tipo de experiência não dará certo com os bichos. Por isso, ele direciona seu foco para alguém que tenha alma.
O melhor conto, no entanto, é justamente A Caixa de Natasha. Não sei por que Menoviks juntou essa história com os demais contos. Poderia tranquilamente ter sido publicada em um livro separado, como um pequeno romance. É uma história que, inicialmente pode parecer confusa, mas que, no final, faz tudo fazer sentido.
Internada em um hospício, Natasha começa a ter visões aparentemente sobrenaturais e passa a questionar sua própria existência. O mistério só é revelado mesmo nas últimas páginas do conto de 110 páginas, que se encerra em um final terrível. A Caixa de Natasha também faz uma breve referência a outros contos do livro.
Além dessas, há outras histórias que merecem menção honrosa, como A Mansão da Noite Eterna, As Inocentes e Nós Comemos Corações de Crianças.
Por outro lado, tem histórias que são bem fracas, como Obscuro Desejo e Vermelho. Em Obscuro Desejo, Menoviks tenta fazer um conto ao estilo de Marquês de Sade, que passa longe do terror. Já em Vermelho, ele abusa de divagações filosóficas que deixam o conto extremamente maçante. A história, em si, que poderia salvar o leitor de um aborrecimento desnecessário, não é boa.
Outra coisa que poderia ser descartada são os três poemas, que destoam do resto do livro. Principalmente, para mim, que não gosto de poesia, os poemas não caíram bem.
Melvin Menoviks também tem uma capacidade ímpar de fazer descrições. Em seus contos, descrições têm quase o mesmo peso que as narrativas. Em Rua Pandora, por exemplo, ele se embrenha em um devaneio descritivo que dura várias páginas.
Mas, ao mesmo tempo em que isso é um dom, a necessidade de descrever tudo nos mínimos detalhes pode ser uma coisa muito ruim e cansar o leitor.
O autor também usa uma linguagem muito rebuscada, quase rococó. Talvez já esteja treinando para exercer a advocacia. Seus contos parecem peças do romantismo gótico do século 19. Para quem gosta desse estilo de texto, é um prato cheio. Mas não sou muito fã desse estilo.
O autor também abusa dos adjetivos. Seu uso é excessivo. Alguns deles, por exemplo, são usados à exaustão, como "onírico" e "ignoto". Para tornar a narrativa mais dark, ele também faz uso exagerado de palavras como "pavoroso", "sombrio", "tenebroso" etc. Em muitos casos, não há a necessidade de usá-las. A própria cena já deixa clara que a situação é pavorosa ou sombria. É um recurso que pode desgastar a qualidade do texto.
Ele também abusa de comparações metafóricas. E, algumas vezes, você simplesmente não consegue entender a metáfora.
Não acredito, no entanto, que essas críticas sejam suficientes para comprometer o livro. A Caixa de Natasha e Outras Histórias de Horror é muito bom, principalmente, repito, por causa de seus contos originais. Menoviks é um grande contador de histórias e provavelmente terá uma brilhante carreira pela frente.
DADOS DO LIVRO:
A Caixa de Natasha e Outras Histórias de Horror
Autor: Melvin Menoviks
Editora: Novo Século (selo Talentos da Literatura Brasileira)
Ano: 2015
Páginas: 376
Preço de capa: R$ 39,90
Muitas das histórias do livro são realmente notáveis (apesar de algumas serem dispensáveis). Como não recorre aos clichês, o autor consegue criar enredos que, em geral, surpreendem o leitor no final. Entre meus contos favoritos estão Malpurga, Natan, A Orquestra Diabólica e A Experiência de William. As quatro me conquistaram pela narrativa relativamente mais simples e por serem as histórias mais sombrias do livros.
Malpurga conta a história de um velho que resolve contar uma história assustadora de sua infância: seu encontro com uma entidade demoníaca chamada Malpurga, que vive em um buraco no meio da floresta e arrasta as pessoas para o purgatório, uma imensidão cinza monótona e eterna. A ideia, em si, já é assustadora. A descrição que Menoviks faz da criatura torna a história ainda melhor. Agora, não sei de onde ele tirou esse nome. Cola na sua cabeça, não sei por quê. Talvez porque pareça com lactopurga.
Natan é a triste história de um pai que descobre que se filho é uma encarnação do diabo. Continho curto, mas eficaz. Já a Orquestra Diabólica é um conto muito interessante sobre uma apresentação sinfônica de Satanás. Quando o público descobre que o regente é o diabo, já é tarde. Não vou contar como termina para não estragar a história. Mas o final é bem interessante.
Por fim, A Experiência de William fala sobre um menininho perturbado que sonha unir os cérebros de dois gatinhos para criar um super animal e, assim, conquistar uma garota de sua escola que nem sabe que ele existe. Mas, quando ele ouve em um sermão eclesiástico que os animais não têm alma, ele acredita que esse é o motivo pelo qual esse tipo de experiência não dará certo com os bichos. Por isso, ele direciona seu foco para alguém que tenha alma.
O melhor conto, no entanto, é justamente A Caixa de Natasha. Não sei por que Menoviks juntou essa história com os demais contos. Poderia tranquilamente ter sido publicada em um livro separado, como um pequeno romance. É uma história que, inicialmente pode parecer confusa, mas que, no final, faz tudo fazer sentido.
Internada em um hospício, Natasha começa a ter visões aparentemente sobrenaturais e passa a questionar sua própria existência. O mistério só é revelado mesmo nas últimas páginas do conto de 110 páginas, que se encerra em um final terrível. A Caixa de Natasha também faz uma breve referência a outros contos do livro.
Além dessas, há outras histórias que merecem menção honrosa, como A Mansão da Noite Eterna, As Inocentes e Nós Comemos Corações de Crianças.
Por outro lado, tem histórias que são bem fracas, como Obscuro Desejo e Vermelho. Em Obscuro Desejo, Menoviks tenta fazer um conto ao estilo de Marquês de Sade, que passa longe do terror. Já em Vermelho, ele abusa de divagações filosóficas que deixam o conto extremamente maçante. A história, em si, que poderia salvar o leitor de um aborrecimento desnecessário, não é boa.
Outra coisa que poderia ser descartada são os três poemas, que destoam do resto do livro. Principalmente, para mim, que não gosto de poesia, os poemas não caíram bem.
Melvin Menoviks também tem uma capacidade ímpar de fazer descrições. Em seus contos, descrições têm quase o mesmo peso que as narrativas. Em Rua Pandora, por exemplo, ele se embrenha em um devaneio descritivo que dura várias páginas.
Mas, ao mesmo tempo em que isso é um dom, a necessidade de descrever tudo nos mínimos detalhes pode ser uma coisa muito ruim e cansar o leitor.
O autor também usa uma linguagem muito rebuscada, quase rococó. Talvez já esteja treinando para exercer a advocacia. Seus contos parecem peças do romantismo gótico do século 19. Para quem gosta desse estilo de texto, é um prato cheio. Mas não sou muito fã desse estilo.
O autor também abusa dos adjetivos. Seu uso é excessivo. Alguns deles, por exemplo, são usados à exaustão, como "onírico" e "ignoto". Para tornar a narrativa mais dark, ele também faz uso exagerado de palavras como "pavoroso", "sombrio", "tenebroso" etc. Em muitos casos, não há a necessidade de usá-las. A própria cena já deixa clara que a situação é pavorosa ou sombria. É um recurso que pode desgastar a qualidade do texto.
Ele também abusa de comparações metafóricas. E, algumas vezes, você simplesmente não consegue entender a metáfora.
Não acredito, no entanto, que essas críticas sejam suficientes para comprometer o livro. A Caixa de Natasha e Outras Histórias de Horror é muito bom, principalmente, repito, por causa de seus contos originais. Menoviks é um grande contador de histórias e provavelmente terá uma brilhante carreira pela frente.
DADOS DO LIVRO:
A Caixa de Natasha e Outras Histórias de Horror
Autor: Melvin Menoviks
Editora: Novo Século (selo Talentos da Literatura Brasileira)
Ano: 2015
Páginas: 376
Preço de capa: R$ 39,90